quarta-feira, 16 de março de 2011

Eu no Alto Minho

Cheguei ontem à noite a Arcos de Valdevez. Fui muito bem recebido, como sempre que venho ao Minho, com sorrisos e bifes enormes a sair do prato. Está a decorrer a Semana da Leitura e Biblioteca Municipal organizou um programa de actividades na Casa das Artes e nas escolas do concelho que mais parece o de um festival literário. Há escritores de todos os géneros, contadores de histórias, músicos. Os professores trabalharam bem os livros com os alunos e isso percebe-se na participação destes durante as sessões, nos livros que compraram e que seguram à espera de um autógrafo.

Hoje à tarde, numa sessão com alunos do 10º, 11º e 12º anos, li pela primeira vez o DEIXEM FALAR AS PEDRAS em voz alta para uma audiência. Já tinha lido dez linhas quando percebi o tremendo risco a que me estava a sujeitar. Umas das vozes do romance é de um rapaz de 14 anos, chamado Valdemar, problemático na escola e em casa, obeso, fanático de heavy-metal. Embora não seja um romance juvenil, enquanto escrevia, tentei encontrar o equilíbrio no tom entre o literário e o realista, sem nunca ter certezas sobre se um adolescente leitor se identificaria com a minha personagem. De modo que hoje, ao ler em público as primeiras dez páginas, acabei, sem querer, por forçar o romance à apreciação de quase uma centena de adolescentes.

Houve muito silêncio. Mas não o mesmo silêncio de alguns minutos antes, quando li um conto do HISTÓRIAS POSSÍVEIS, que pouco lhes disse. Era um silêncio mais forte, eles queriam falar mas alguma coisa dentro deles impedia-os. Queriam ouvir. De vez em quando respiravam mais alto, todos ao mesmo tempo. Riram-se algumas vezes, quando eu disse palavras como "cabrão", mas também em momentos em que o Valdemar é irónico e cínico na sua descrição dos acontecimentos. Depois de 10 minutos eu parei e disse: "Querem que continue?" Eles disseram que sim, baixinho. Eu continuei. No final bateram palmas (o que também não tinha acontecido na leitura anterior) e quando o aplauso terminou alguém perguntou quanto é que o livro custa. Eu não sei quanto é que o livro custa. Eles levantaram-se e saíram. Eu estava feliz, mas acho que eles não deram conta.

Amanhã há mais sessões aqui nos Arcos. Ainda bem.

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